A importância da vitamina D e da exposição consciente ao sol: Parte 3
Nos meus dois últimos artigos, expliquei porque é que a vitamina D é crucial para a nossa saúde e o que podemos fazer para atingir níveis normais, incluindo dicas para nos expormos ao sol de uma forma segura, de maneira a obtermos uma dose natural diária de vitamina D. Então mas e se estivermos lá fora o dia todo? Aí vamos precisar de uma proteção solar apropriada. E com isto, não me estou a referir ao uso de protetores solares (pelo menos, não os “convencionais”). Neste artigo vou escrever sobre 1) os problemas com os protetores solares, 2) abordagens naturais para nos protegermos do sol. Se ainda não o fez, recomendo vivamente que leia também a Parte 1 (onde explico a associação entre a falta de vitamina D e muitas doenças, incluindo o cancro) e a Parte 2 (onde dou algumas dicas sobre o que fazer para chegar a níveis normais de vitamina D).
Problemas com os protetores solares
Muitos profissionais de saúde têm culpado a exposição ao sol pelo aumento do número de casos de cancro da pele. Mas pensemos nisto. O uso de protetores solares está também a aumentar – hoje em dia, grande parte da população utiliza protetores solares. Então, porque está a incidência de cancro da pele a aumentar? Sinceramente, não acho que seja porque as pessoas não estão a usar protetor solar suficiente. Outros cientistas também estão a questionar este assunto [22]. Neste estudo, os autores dizem:
“Três observações importantes levaram-nos a rever os dados de estudos em animais e humanos sobre os possíveis efeitos secundários dos filtros químicos dos UV [protetores solares] em cosméticos. (1) a utilização de protetores solares com filtros UV está a aumentar no mundo, (2) a incidência de doenças malignas para as quais os protetores solares deveriam proteger, como o melanoma maligno, estão a aumentar rapidamente e (3) um número crescente de estudos experimentais indica que vários filtros UV podem desregular o sistema endócrino“. [22]
Como expliquei neste artigo, a ciência tem mostrado que quanto maior a exposição ao sol e portanto, os níveis de vitamina D, menor o risco muitos tipos de cancro, incluindo o da pele (se não estivermos constantemente a apanhar queimaduras solares). Além disso, tem-se observado que as pessoas que trabalham ao ar livre têm menos melanomas do que pessoas que trabalham no interior [23].
Então e se eu lhe disser que a maioria dos protetores solares fazem mais mal do que bem? E mais, e se eu disser que na verdade não há estudos grandes (de meta-análise) que demonstrem que os protetores solares protegem contra o cancro da pele?
Reconheço que em algumas situações um protetor solar natural poderá ser necessário (leia a seção seguinte para saber a que tipo de situações me refiro e o que quero dizer com “natural”). No entanto, em geral, não acho que o uso de protetores solares seja uma boa ideia, porque:
– bloqueiam os UVBs e, portanto, a síntese de vitamina D na nossa pele [1].
– embora bloqueiem os UVB, alguns deixam os UVA passar (portanto, podemos até ficar brozeados, mas ainda ter falta de vitamina D).
– muitas pessoas que usam protetor solar têm tendência a ficar ao sol mais tempo, porque pensam que estão “protegidos”. E depois acabam por de fato apanhar uma queimadura solar.
– como referi, não há estudos grandes que demonstrem que os protetores solares protegem contra o cancro da pele.
– muitas das substâncias utilizadas nos protetores solares para filtrar os raios UV (portanto, também chamados de “filtros UV”) nunca foram provadas como sendo seguras. Por outro lado, foi demonstrado que muitas destas substâncias são potencialmente tóxicas e podem ser absorvidas pela nossa pele e entrar no nosso corpo. Na verdade, a Agência Dinamarquesa de Proteção Ambiental, no seu relatório de 2015, escreveu que algumas das substâncias presentes em protetores solares são suspeitas de serem “destrutores endócrinos com relevância tanto para o meio ambiente quanto para a saúde” (nas suas próprias palavras). Estas incluem [24, 25]:
– Benzofenona-3 (também conhecido como oxibenzona): este composto é o primeiro da lista de substâncias de risco presentes em protetores solares, de acordo com o Grupo de Trabalho Ambiental dos Estados Unidos (EWG, Environmental Working Group). O EWG escreve no seu site “atua como estrogénio no corpo, altera a produção de esperma em animais, associado à endometriose em mulheres” [25].
– Etilhexil metoxicinamato (também conhecido como octilo metoxicinamato ou octinoxato): este está em segundo lugar na lista do EWG. Tem atividade hormonal, está associado a alterações no sistema reprodutor, tiróide e comportamento em estudos em animais [25].
– homosalato – perturba o estrogénio, andrógeno e progesterona [25].
– Octocrileno
– Benzofenona-1
– 4-metilbenzilideno cânfora (ou 4-MBC)
– Isoamil p-metoxicinamato
– Benzofenona
– Benzofenona-12
Outro ingrediente presente em protetores solares e que devemos evitar é a vitamina A ou os seus derivados retinol e palmitato de retinil. A vitamina A é uma vitamina crucial para nós, mas apenas quando nos é fornecida em alimentos. Nos protetores solares (ou em outros cosméticos), verificou-se que aumenta o desenvolvimento de tumores e lesões cutâneas quando aplicada na pele em presença de luz solar [26]. Por isso, tenha cuidado também com este composto.
Estou a dar-lhe esta lista para que sempre que queira comprar um protetor solar, possa verificar se algum destes compostos está na lista de ingredientes.
No entanto, estes são apenas alguns dos compostos presentes em protetores solares. Se olhar para a lista de ingredientes do seu protetor solar, verá muitos outros químicos, que provavelmente nunca foram testados ou provados como sendo seguros, e cujos nomes nem sequer conseguimos pronunciar. Eu definitivamente não quero pôr isso na minha pele, e vocês? É que a maior parte dos químicos que pomos na nossa pele são absorvidos e vão para dentro do nosso corpo.
Investigadores da ETH Zurique, na Suíça, também descobriram que a “população suiça-alemã está exposta a filtros UV questionáveis em quantidades que podem ser prejudiciais para a saúde” [27], nomeadamente, o etilhexil metoxicinamato (octil metoxicinamato) [28] e o octocrileno [29]. Infelizmente, não acho que seja apenas a população suiça que tem este problema …
E saiba que muitos destes compostos químicos também estão presentes noutros cosméticos, como cremes para o rosto e bases.
Outro problema muito relevante e que eu achei particularmente chocante é que estes químicos foram encontrados em mais de 85% das amostras de leite materno !! [30] Isto indica que os fetos em desenvolvimento e recém-nascidos estão a ser expostos a estas substâncias que nunca foram provadas como sendo seguras em adultos (pelo contrário) quanto mais em bebés!
Se estiver interessado neste tópico, recomendo a leitura deste relatório do EWG [25] e deste da Agência Dinamarquesa de Proteção Ambiental [24].
Abordagens naturais para proteção solar
Existem situações em que precisamos de algum tipo de proteção, porque precisamos de estar ao sol durante muitas horas e queremos mesmo evitar queimaduras solares. Então, o que podemos fazer?
1. Proteção “física”
A abordagem mais eficaz é usar roupas leves para proteger a pele e um chapéu grande que cubra a cara e o pescoço.
2. Controle o tempo que está ao sol
Claro que há certas alturas em que não nos apercebemos que estamos a apanhar demasiado sol. Ou em que não podemos usar roupa ou chapéu. Por exemplo, quando estamos no mar/piscina/rio durante mais tempo – sentimo-nos frescos e portanto, não nos apercebemos que o sol está a queimar. Nestes casos, recomendaria definir previamente o tempo que quer estar ao sol e ir para a sombra depois disso. Como mencionei no meu artigo anterior, ficar ao sol durante cerca de 20-30minutos deverá chegar para produzir vitamina D suficiente. No entanto, tenha atenção que esta duração depende da pigmentação da sua pele (se tiver a pele mais branca precisa de menos tempo, se tiver a pele mais escura precisa de mais tempo). Para mais informações sobre este tópico, leia o meu artigo anterior.
3. Protetor solar “natural”
Então e se quiser ficar na água durante mais tempo (ou precisa)?
Aí, use um protetor solar natural. Em algumas situações não temos outra opção senão usar protetor solar, pois não podemos ir para a sombra. Por exemplo, quando estamos a fazer certos desportos aquáticos ou de inverno (como esquiar). Aqui, recomendo que use um protetor solar natural. E o que quero dizer com “natural”?
Há muitos protetores solares no mercado que têm escrito “natural” em letras grandes…é uma boa manobra de marketing. No entanto, não se deixe enganar pela palavra “natural”. Veja sempre a lista de ingredientes! Num dos meus artigos anteriores, referi que deve sempre verificar os ingredientes dos alimentos que compra. O mesmo se aplica aos cosméticos – isto é muito importante. Os protetores solares que são de fato naturais devem conter apenas óleos naturais (como óleo de coco, manteiga de karité, óleo de amêndoa, óleo de semente de cenoura, óleo de semente de framboesa – estes têm por si só já um factor de proteção solar), óleos essenciais, e óxido de zinco (mas certifique-se de que não é a versão de nanopartículas). Algumas pessoas pensam que todos os protetores solares minerais (contrariamente aos protetores solares químicos mencionados acima) são naturais. Em muitos casos, estes são muito melhores do que os químicos. Mas noutros casos, podem conter uma mistura de químicos e minerais. Noutros casos ainda, podem conter algum tipo de ingrediente que não é de todo natural ou ecológico. Por isso, procure protetores solares cuja lista de ingredientes contém apenas óleos naturais e óxido de zinco (não nano). Também pode fazer o seu próprio protetor solar 🙂 Num artigo futuro irei escrever como pode fazer o seu próprio protetor solar.
4. Protetor solar “interno”
É muito importante utilizarmos também um protetor solar “interno”: uma alimentação saudável com muitos vegetais crus e frutas frescas é super importante! Estes fornecem- nos os antioxidantes que precisamos para nos ajudar a combater os radicais livres causados por danos devidos ao sol e que poderiam levar ao cancro. Há compostos específicos nos vegetais e frutas que nos dão uma proteção “interna” contra os UV. Por exemplo, os carotenóides [15], como o β-caroteno, presente por exemplo em legumes e frutos amarelos ou cor-de-laranja como cenouras, batatas doces, pêssegos, mangas, papaias e abóboras. Além disso, as vitaminas do complexo B também ajudam a prevenir o cancro da pele [16, 17]. Por outro lado, as pessoas que têm uma aliementação rica em alimentos processados, com açúcar e óleos refinados e nada saudáveis, são mais propensas a ter cancro da pele [18-20]. Uma das coisas que notei quando mudei a minha alimentação foi que minha pele tornou-se muito mais tolerante ao sol.
Conclusão destes 3 artigos
Aproveite o verão, vá lá para fora e obtenha a sua dose natural de vitamina D. A luz solar é essencial para nós, e se feita corretamente, a exposição ao sol é uma das melhores coisas que podemos fazer pela nossa saúde. Mas por favor não exagere. Deve evitar queimaduras solares e, ao mesmo tempo, otimizar os seus níveis de vitamina D. Evite usar protetores solares e, se necessário, procure um mais natural com óxido de zinco e óleos naturais e que não contenha as substâncias acima mencionadas (ou outras cujo nome seja difícil de pronunciar – esta é a minha regra geral). Uma alimentação saudável também o/a irá ajudar a proteger a sua pele e a prevenir o cancro da pele.
Agora gostaria de saber sobre si 🙂 o que costuma fazer para se proteger do sol de uma forma natural?
Viva saudável 🙂
Ana
Referências
[1] M. Krause, A. Klit, M. Blomberg Jensen, T. Soeborg, H. Frederiksen, M. Schlumpf, W. Lichtensteiger, N. E. Skakkebaek, and K. T. Drzewiecki, “Sunscreens: are they beneficial for health? An overview of endocrine disrupting properties of UV-filters,” Int J Androl, vol. 35, no. 3, pp. 424-36, Jun, 2012.
[2] J. K. Rivers, “Is there more than one road to melanoma?,” Lancet, vol. 363, no. 9410, pp. 728-30, Feb 28, 2004.
[3] L. Y. Matsuoka, L. Ide, J. Wortsman, J. A. MacLaughlin, and M. F. Holick, “Sunscreens suppress cutaneous vitamin D3 synthesis,” J Clin Endocrinol Metab, vol. 64, no. 6, pp. 1165-8, Jun, 1987.
[4] R. Haywood, P. Wardman, R. Sanders, and C. Linge, “Sunscreens inadequately protect against ultraviolet-A-induced free radicals in skin: implications for skin aging and melanoma?,” J Invest Dermatol, vol. 121, no. 4, pp. 862-8, Oct, 2003.
[5] D. E. Godar, R. J. Landry, and A. D. Lucas, “Increased UVA exposures and decreased cutaneous Vitamin D(3) levels may be responsible for the increasing incidence of melanoma,” Med Hypotheses, vol. 72, no. 4, pp. 434-43, Apr, 2009.
[6] D. E. P. Agency, “Survey and health assessment of UV filters,” http://i2.cdn.turner.com/cnn/2016/images/04/14/978-87-93352-82-7.pdf, 2015.
[7] “The Trouble With Ingredients in Sunscreens,” http://www.ewg.org/sunscreen/report/the-trouble-with-sunscreen-chemicals/#.WYRX-1FpyUk.
[8] “The Problem With Vitamin A,” http://www.ewg.org/sunscreen/report/the-problem-with-vitamin-a/#.WYSe3lFpyUk.
[9] “Sunscreens may be harmful,” https://www.ethz.ch/en/news-and-events/eth-news/news/2015/02/sunscreens-may-be-harmful.html.
[10] E. Manova, N. von Goetz, and K. Hungerbuehler, “Aggregate consumer exposure to UV filter ethylhexyl methoxycinnamate via personal care products,” Environ Int, vol. 74, pp. 249-57, Jan, 2015.
[11] E. Manova, N. von Goetz, and K. Hungerbuhler, “Ultraviolet filter contact and photocontact allergy: consumer exposure and risk assessment for octocrylene from personal care products and sunscreens,” Br J Dermatol, vol. 171, no. 6, pp. 1368-74, Dec, 2014.
[12] M. Schlumpf, K. Kypke, M. Wittassek, J. Angerer, H. Mascher, D. Mascher, C. Vokt, M. Birchler, and W. Lichtensteiger, “Exposure patterns of UV filters, fragrances, parabens, phthalates, organochlor pesticides, PBDEs, and PCBs in human milk: correlation of UV filters with use of cosmetics,” Chemosphere, vol. 81, no. 10, pp. 1171-83, Nov, 2010.
[13] W. Stahl, and H. Sies, “beta-Carotene and other carotenoids in protection from sunlight,” Am J Clin Nutr, vol. 96, no. 5, pp. 1179S-84S, Nov, 2012.
[14] A. C. Chen, A. J. Martin, B. Choy, P. Fernandez-Penas, R. A. Dalziell, C. A. McKenzie, R. A. Scolyer, H. M. Dhillon, J. L. Vardy, A. Kricker, G. St George, N. Chinniah, G. M. Halliday, and D. L. Damian, “A Phase 3 Randomized Trial of Nicotinamide for Skin-Cancer Chemoprevention,” N Engl J Med, vol. 373, no. 17, pp. 1618-26, Oct 22, 2015.
[15] S. L. Zhang, T. S. Chen, C. Y. Ma, Y. B. Meng, Y. F. Zhang, Y. W. Chen, and Y. H. Zhou, “Effect of vitamin B supplementation on cancer incidence, death due to cancer, and total mortality: A PRISMA-compliant cumulative meta-analysis of randomized controlled trials,” Medicine (Baltimore), vol. 95, no. 31, pp. e3485, Aug, 2016.
[16] R. Katta, and S. P. Desai, “Diet and dermatology: the role of dietary intervention in skin disease,” J Clin Aesthet Dermatol, vol. 7, no. 7, pp. 46-51, Jul, 2014.
[17] H. S. Black, “The role of nutritional lipids and antioxidants in UV-induced skin cancer,” Front Biosci (Schol Ed), vol. 7, pp. 30-9, Jun 01, 2015.
[18] H. S. Black, and L. E. Rhodes, “Potential Benefits of Omega-3 Fatty Acids in Non-Melanoma Skin Cancer,” J Clin Med, vol. 5, no. 2, Feb 04, 2016.