Benefícios da actividade física para a nossa saúde mental
Quando ouvimos falar de actividade física, costumamos pensar na perda de peso e não tanto nos seus benefícios para a saúde mental. Por isso, decidimos dedicar dois artigos aos benefícios mentais e físicos do exercício físico. Este primeiro artigo resume as descobertas de como a nossa saúde mental pode beneficiar com diferentes tipos de atividade física. Em breve iremos dedicar também um artigo aos benefícios do exercício no nosso bem-estar físico.
Melhoria do humor
O exercício físico regular (cardio e musculação) pode melhorar o nosso humor. Um fato interessante é o efeito da duração do exercício no humor. Tem-se sugerido que quanto mais tempo fizermos exercício, mais os nossos sentimentos negativos diminuem [1]. Certos exercícios, como o treino aeróbico ou a dança aeróbica, também melhoram o humor, mesmo após uma única sessão [2]. Num outro estudo em mulheres, o exercício aeróbico regular (cerca de 5 horas por semana) levou a uma melhoria de certos estados de humor negativos, como a raiva, desprezo, desgosto, tristeza, hostilidade, medo, vergonha, timidez e culpa [3]. Esta melhoria também incluiu o humor relacionado com os sintomas pré-menstruais que algumas mulheres experienciam.
Melhoria da depressão e ansiedade
Já alguma vez ouviu dizer que os médicos prescrevem atividade física a indivíduos com depressão? Embora as pessoas com depressão sejam geralmente menos ativas do que as pessoas não deprimidas, o aumento da atividade física, como exercícios aeróbicos ou treinos de fortalecimento muscular, pode reduzir significativamente os sintomas de depressão [4].
Pessoas com ansiedade e transtorno de pânico também podem beneficiar com o exercício físico, uma vez que este reduz os sintomas de ansiedade e até pode ter uma eficácia semelhante à da meditação ou relaxamento [4].
Maior confiança e auto-estima
A maioria dos estudos sobre exercício físico tem incidido sobre os benefícios em indivíduos saudáveis. O estudo que mencionamos agora, no entanto, é sobre os efeitos positivos do exercício em indivíduos com deficiência intelectual. Os investigadores deste estudo descobriram que um ritmo auto-selecionado de corrida (por exemplo, cerca de 30 minutos de corrida a um ritmo moderado) pode aumentar a auto-estima, a autoconfiança e a aceitação social, bem como o humor em indivíduos com deficiência intelectual [5].
Num outro estudo em crianças de 12 anos, descobriu-se que a atividade física está correlacionada com uma maior auto-estima [6].
Noutro estudo, 174 adultos (com idade média de 65 anos) foram incluídos numa intervenção de 6 meses que incluiu um de dois programas de treino: caminhada (treino aeróbico) ou alongamento (tonificação muscular). Em ambos os programas, houve um aumento significativo da auto-estima após a conclusão da intervenção. No entanto, após seguirem estes indivíduos durante mais 6 meses (após a conclusão da primeira intervenção de 6 meses), descobriram que a auto-estima tinha diminuido significativamente, e que esta diminuição tinha sido maior no grupo que tinha feito caminhada do que no grupo que tinha feito alongamentos. Os autores sugeriram que esta diferença pode dever-se ao fato de que “andar” é mais geral e que “alongar” é mais específico (e aqui as pessoas usaram bandas de tonificação específicas) [7] e, provavelmente, exercícios mais específicos podem trazer-nos mais benefícios do que exercícios mais gerais.
Aumento da criatividade
Num estudo sobre criatividade e exercício, descobriu-se que a criatividade dos participantes aumentou após uma corrida de 2,4 km [8]. Para além da corrida, também se tem demonstrado que outros exercícios aeróbicos regulares, tal como a dança aeróbica, podem melhorar o pensamento criativo [2].
Memória e aprendizagem
A atividade física pode também melhorar a memória e a aprendizagem tanto em humanos como em ratinhos. A formação e o armazenamento da memória foram avaliados em ratinhos após estes correrem todos os dias durante 3 semanas. Durante este periodo de tempo, os ratinhos também foram treinados a encontrar uma plataforma num tanque com água. Os investigadores puseram os ratinhos num tanque com água com 6 plataformas, onde apenas uma estava a cerca de 1cm abaixo de água, de modo aos ratinhos se conseguirem sentar nela. A memória de cada ratinho foi então testada, dependendo da duração que cada um precisou para encontrar esta plataforma na água. Os ratinhos que tiveram um melhor desempenho de memória foram aqueles que foram treinados a encontrar a plataforma imediatamente após correrem [9]. O fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF, do inglês brain-derived neurotrophic factor) é importante nos mecanismos necessários à formação e armazenamento da memória. Os níveis de BDNF aumentaram imediatamente após o período de exercício físico e mostraram uma correlação com a melhoria cognitiva e o desempenho de memória no 4° dia após o periodo de exercício físico. Parece, então, que o periodo de aprendizagem é fundamental para que o exercício tenha um impacto positivo na memória e aprendizagem [9].
Estudos em humanos obtiveram resultados semelhantes. O exercício físico regular pode melhorar as funções cognitivas e reduzir o risco de declínio cognitivo relacionado com a idade, como a doença de Alzheimer [10, 11]. No entanto, parece também ter uma influência imediata na nossa memória e aprendizagem. Num estudo feito em adultos saudáveis, os participantes tiveram que aprender novas palavras e a sua memória foi avaliada após uma corrida de alto impacto (2 sprints de 3 minutos a uma velocidade crescente com níveis de lactato na sangue > 10 mmol) e de baixo impacto (40 minutos de corrida com níveis de lactato no sangue de 2 mmol). O BDNF e as catecolaminas (dopamina, epinefrina, norepinefrina) foram avaliados antes e após ambas as intervenções, bem como após a aprendizagem. Os investigadores observaram que a aprendizagem de novas palavras tinha sido 20% mais rápida após o exercício físico de maior impacto, levando a um maior aumento dos níveis de BDNF e catecolaminas. Descobriram, portanto, que níveis mais elevados e estáveis de BDNF durante a aprendizagem e depois do exercício físico intenso estão relacionados com uma melhor aprendizagem a curto prazo. Por outro lado, os níveis mais elevados de dopamina e epinefrina foram, respectivamente, os responsáveis pela aprendizagem de médio e longo prazo de novas palavras. Assim, parece que o BDNF, a dopamina e a epinefrina são os responsáveis por melhorar a nossa aprendizagem e memória após o exercício físico [12].
Melhoria do sono
O exercício pode ter efeitos positivos e únicos no sono. No entanto, como o equilíbrio e a moderação são fundamentais em tudo, a atividade física intensa também pode aumentar a sensação de cansaço, o que, por sua vez, pode prejudicar o nosso sono. Para podermos beneficiar dos efeitos positivos do exercício no nosso sono, devemos considerar a intensidade, o tipo (não deve ser muito intenso) e a hora do exercício [13]. Os investigadores sugerem que para experienciar os efeitos benéficos do exercício, devemos fazer exercicio suficientemente perto da hora de ir dormir, para estimular uma resposta termorreguladora, mas também não muito próximo, para que não perturbe o nosso sono. Em geral, é recomendado fazer exercício de 5 a 6 horas antes de ir dormir e não é recomendado fazer menos de 3 horas antes de ir para a cama. Fazer exercicio durante mais de 2 horas (overtraining) deve ser evitado, uma vez que também pode perturbar o nosso sono [13].
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Referências
1) Rocheleau, C. A., Webster, G. D., Bryan, A., & Frazier, J. (2004). Moderators of the relationship between exercise and mood changes: Gender, exertion level, and workout duration. Psychology & Health, 19(4), 491-506.
2) Steinberg, H., Sykes, E. A., Moss, T., Lowery, S., LeBoutillier, N., & Dewey, A. (1997). Exercise enhances creativity independently of mood. British Journal of Sports Medicine, 31(3), 240-245.
3) Aganoff, J. A., & Boyle, G. J. (1994). Aerobic exercise, mood states and menstrual cycle symptoms. Journal of psychosomatic research, 38(3), 183-192.
4) Paluska, S. A., & Schwenk, T. L. (2000). Physical activity and mental health. Sports medicine, 29(3), 167-180.
5) Vogt, T., Schneider, S., Abeln, V., Anneken, V., & Strüder, H. K. (2012). Exercise, mood and cognitive performance in intellectual disability—A neurophysiological approach. Behavioural Brain Research, 226(2), 473-480.
6) Tremblay, M. S., Inman, J. W., & Willms, J. D. (2000). The relationship between physical activity, self-esteem, and academic achievement in 12-year-old children. Pediatric exercise science, 12(3), 312-323.
7) McAuley, E., Blissmer, B., Katula, J., Duncan, T. E., & Mihalko, S. L. (2000). Physical activity, self-esteem, and self-efficacy relationships in older adults: a randomized controlled trial. Annals of Behavioral Medicine, 22(2), 131-139.
8) Gondola, J. C. (1986). The enhancement of creativity through long and short term exercise programs. Journal of Social Behavior & Personality.
9) Berchtold, N. C., Castello, N., & Cotman, C. W. (2010). Exercise and time-dependent benefits to learning and memory. Neuroscience, 167(3), 588-597.
10) Riley, T., Holman, M., Holman, S., Head, S., Zylberberg, J., & Berra, N. Exercise and Alzheimer’s Disease.
11) Adlard, P. A., Perreau, V. M., Pop, V., & Cotman, C. W. (2005). Voluntary exercise decreases amyloid load in a transgenic model of Alzheimer’s disease. Journal of Neuroscience, 25(17), 4217-4221.
12) Winter, B., Breitenstein, C., Mooren, F. C., Voelker, K., Fobker, M., Lechtermann, A., … & Knecht, S. (2007). High impact running improves learning. Neurobiology of learning and memory, 87(4), 597-609.
13) Driver, H. S., & Taylor, S. R. (2000). Exercise and sleep. Sleep medicine reviews, 4(4), 387-402.